sexta-feira, 17 de julho de 2009

Atestado de fé: 23 anos com o coração na garganta



Levando em conta minha quase infinita ingenuidade, penso que os homens, de forma mais ou menos determinada, já nascem com seus signos na testa; e não falo aqui, leitor, de respeitáveis sinais do Zodíaco, seja este chinês, grego ou burundinês. Falo de um sinal mais profundo, marcado a fogo na alma em eras pré-placentárias, sulco que transcende a pele e não raro extrapola o sinal, torna-se sina. Irredutível à medicina ou a teorias psicanalíticas, a dita marca domina o indivíduo, que nela já não vê obstáculo, idiossincrasia a superar, mas signo de nobreza, distinção em meio à turba alienada.
É neste sentido que entendo o impulso apaixonado de uma nação que abafou seu grito por longos 23 anos, que por longas duas décadas viu rivais refocilarem em suas chagas, e tornou-se motivos de chacotas, de piadas. Esta nação, porém, suportou; aguentou a provação com a certeza de que honra o fado quem carrega o fardo; apesar da aspereza do mundo, a coragem de continuar é possível.
Este simples texto é escrito no intuito de tentar criar, com as palavras, o mesmo sentimento suscitado quando vi o filme “23 anos em 7 segundos”, que conta a história do martírio corinthiano dos 23 anos sem títulos. Como já devem ter percebido, gostei do resultado final. O filme tem por intuito apresentar, de forma sucinta, o que se passa durante o período de seca, para, depois, fechar a questão, como num close, na final contra a Ponte Preta. O recheio do bolo fica por conta dos estudos acerca do corinthianismo, elevado ao status de religião pelos entrevistados.
A tensão, os personagens, e todo o enredo mítico a envolver o fato nos são apresentados com bastante competência e precisão; por alguns momentos, me senti dentro da história. Aqui, é preciso apontar a eficiência dos relatos de Juca Kfouri, uma verdadeira enciclopédia, e dos ex-jogadores, sempre pontuais e emocionados, com destaque para Basílio (óbvio) e Wladmir.
Porém, nem tudo é um jardim de flores... O filme possui algumas falhas consideráveis, relacionadas aos entrevistados. Não dá para entender, por exemplo, o motivo de terem convidado a Sabrina Sato; não viveu a época, e nem é tão torcedora. Está mais para celebridade de segunda linha que se aproveita da torcida do Timão, do que para torcedora propriamente dita. Quase o mesmo pode ser dito de Rappin Hood, com a exceção de que o carisma do rapper é infinitamente superior ao dela, e de que seu corinthianismo é comprovado. Defensores incontestes do filme podem rebater meus argumentos, dizendo que os convidados lá estão, pois um dos objetivos é construir um atestado do “ser corinthiano”. Concordo apenas em parte com tal proposição, dado que há formas e formas de cumprir tal tarefa; se Sabrina Sato e Rappin Hood pouco acrescentam, Hortência, a Rainha do basquete, formulou, de forma natural, a frase que resume o filme, e digna de fechar este texto: “Corinthiano, corinthiano é quem aguenta!”.

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